Isis Machado
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que até o ano de 2030 haverá cerca de 78 milhões de pessoas com demência no mundo, sendo que tal número pode chegar a 139 milhões em 2050 [1], fator alarmante, especialmente para países com baixa e média renda.
Na maioria dos países, os sistemas de saúde e de assistência social não estão preparados para o atual e tampouco para o futuro número de pessoas que vivem com demência. Por isso, a OMS e outros organismos internacionais têm trabalhado para incluir a demência como uma prioridade de saúde pública, por meio do Plano de Ação Global 2017-2025. A proposta engloba ações políticas, legislativas, de conscientização social, de redução de riscos, de diagnóstico, tratamento e suporte para cuidado, de sistemas informativos e uma agenda de pesquisa e inovação voltada para esse campo [2].
A demência pode ser caracterizada como uma síndrome, de natureza crônica ou progressiva, que leva ao comprometimento da capacidade de processar o pensamento, afetando memória, pensamento, orientação, compreensão, cálculo, capacidade de aprendizagem, linguagem e julgamento. A consciência, porém, não é afetada [1]. Certo é que a falta de compreensão quanto à demência resulta em estigmatização e barreiras ao diagnóstico e atendimento.
Nesse sentido, faz-se importante tratar de direitos específicos voltados aos pacientes com demência, aos seus cuidadores e familiares, visto que tais direitos são, frequentemente, negligenciados ou simplesmente desconsiderados. Tratar de tais direitos visa conferir voz ativa e proporcionar um cuidado que corresponda às necessidades individuais desses pacientes.
Pensando nisso, alguns documentos foram publicados a fim de abordar a temática. A OMS, por exemplo, publicou um documento elencando alguns direitos humanos essenciais aos pacientes com demência, firmando o acrônimo PANEL, que diz respeito aos direitos de Participação, Accountability, Não discriminação, Empoderamento e Legalidade [3]. O documento visa garantir o respeito a direitos humanos voltados a pessoas que vivem com demência.
Outro exemplo é a Carta Canadense de Direitos das Pessoas com Demência, a qual prevê uma série de direitos atinentes a tal grupo de pessoas, dentre os quais encontram-se o direito em obter apoio para tomada de decisões, inclusive quanto ao a todo o procedimento terapêutico e o direito em ser atendido por profissionais de saúde treinados para cuidar de pacientes com demência, respeitando e promovendo seus direitos humanos [4].
Segundo Albuquerque [5], o Cuidado Centrado no Paciente deve ser a base para os cuidados em saúde aplicados ao contexto dos pacientes com demência, levando em conta a sua individualidade. Além disso, a autora defende a importância de observar o direito ao consentimento informado, ao cuidado de qualidade e seguro, à informação, à participação da tomada de decisão, à confidencialidade das informações pessoais e direito de não ser discriminado [5].
O Brasil ainda não publicou legislação que trate dos direitos de pacientes com demência e que aborde a necessidade de um cuidado centrado no paciente e trate de outros direitos. Esperamos que seja feito em breve, visto que, não raras vezes, a falta de informação disponível a pacientes, familiares, cuidadores e profissionais de saúde acaba por criar ou incrementar barreiras no tratamento e no cuidado de pacientes com demência. Essa é uma pauta urgente para nosso país!
[1] WHO. Global status report on the public health response to dementia. 2021. Disponível em https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/344701/9789240033245-eng.pdf
[2] WHO. Global action plan on the public health response to dementia 2017–2025. Geneva. 2017. Disponível em https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259615/9789241513487-eng.pdf
[3] WHO. Ensuring a human rights-based approach for people living with dementia. Geneva, 2015. Disponível em https://www.ohchr.org/sites/default/files/Documents/Issues/OlderPersons/Dementia/ThematicBrief.pdf
[4] MANN, Jim. Canadian charter of rights for people with dementia. Dementia, v. 19, n. 1, p. 63-67, 2020.
[5] ALBUQUERQUE, Aline; SANT’ANNA, Anne ; ANDORNO,, Roberto . Direitos dos Pacientes que vivem com Demência. In: Ana Cláudia Scalquette; Patrícia Vanzolini; Renata da Rocha; Rodrigo Arnoni Scalquette. (Org.). What’s up? Desafios ao Direito. 1ed.Lisboa: Almedina, 2022, v. , p. 137-