Conheça a Carta de Direitos de Segurança do Paciente

Atualizado em 18/06/2024
Por Aline Albuquerque

Conheça a Carta de Direitos de Segurança do Paciente

Atualizado em 18/06/2024
Por Aline Albuquerque

Conheça a Carta de Direitos de Segurança do Paciente

Neste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou a primeira Carta de Direitos de Segurança do Paciente1, que consiste em um instrumento fundamental destinado a apoiar a implementação do “Plano de Ação Global para a Segurança do Paciente 2021–2030: Rumo à eliminação de danos evitáveis ​​nos cuidados de saúde.”2

A Carta visa delinear os direitos dos pacientes no contexto da segurança e promove a garantia desses direitos, conforme estabelecido nas normas internacionais de direitos humanos. Importante ressaltar que a Carta parte dos direitos humanos para extrair os direitos que se aplicam à segurança do paciente. Portanto, pode-se afirmar que a Carta consolida a interface entre direitos humanos e segurança do paciente, objeto de nossas pesquisas desde 20163

A Carta tem como principais objetivos: (a) afirmar a segurança do paciente como um direito fundamental do paciente; (b) identificar os principais direitos de segurança do paciente que os profissionais de saúde e os líderes de organizações de saúde devem assegurar quando planejar, projetar e fornecer serviços de saúde seguros; (c) promover uma cultura de segurança, equidade, transparência e responsabilização nos sistemas de saúde; (d) capacitar os pacientes para participarem ativamente nos seus próprios cuidados como parceiros e para fazerem valer o seu direito a cuidados seguros; (e) reconhecer a segurança do paciente como componente integrante do direito à saúde.

Os 10 Direitos de Segurança do Paciente são apresentados a seguir de forma sintetizada:

Direito ao cuidado apropriado, oportuno e efetivo – Os pacientes têm o direito de receber cuidados oportunos e efetivos, adaptados às suas necessidades de saúde, especialmente em situações em que a demora em receber os cuidados de saúde necessários pode levar à progressão da doença, deterioração clínica, falha no resgate e má resultados como danos evitáveis ​​ao paciente.

Direito a práticas e processos seguros de cuidados de saúde – Os pacientes têm o direito de que os profissionais de saúde sigam processos e práticas seguras e implementem medidas para identificar, prevenir e gerenciar riscos e reduzir danos evitáveis ​​aos pacientes.

Direitos a profissionais de saúde competentes e qualificados – Os pacientes têm direito de receber cuidados de saúde prestados por profissionais que possuam as qualificações, habilidades e competências necessárias e que estejam alinhadas com os padrões nacionais e internacionais, o que lhes permitam prestar cuidados seguros, assim como prevenir e mitigar riscos de segurança e causar danos.

Direito a produtos médicos seguros e ao seu uso racional e seguro – Os pacientes têm direito de acesso aos produtos médicos de que necessitam, incluindo medicamentos, vacinas, dispositivos médicos, diagnósticos, sangue e seus derivados, medicamentos tradicionais e complementares e tecnologias assistivas e médicas que atendam a padrões e a regulamentos reconhecidos de segurança, qualidade e eficácia.

Direito a instalações de cuidados de saúde seguras – Os pacientes têm direito à manutenção da integridade estrutural das instalações de saúde, garantindo a resiliência climática e ambientes livres de fumo, implementando protocolos e caminhos de evacuação seguros, bem como a adesão a padrões de segurança contra incêndio, problemas elétricos e de radiação.

Direito à dignidade, ao respeito, a não discriminação, à privacidade e à confidencialidade4 – Este direito abrange a proteção contra qualquer abuso, negligência, violência, tratamento degradante ou privação de liberdade, e é especialmente crucial em cenários de cuidados delicados, como cuidados paliativos e situações de fim de vida, em que a dignidade e o conforto são cruciais.

O direito abarca o respeito à autonomia dos pacientes e às suas decisões.

Todas as informações identificáveis ​​sobre a condição médica, histórico ou tratamento de um paciente devem ser mantidas confidenciais e só devem ser divulgadas com o consentimento explícito do paciente ou de seu representante escolhido, ou conforme requerido pela lei.

Direito à informação, à educação e à tomada de decisão apoiada – Os pacientes têm o direito de receber, em tempo hábil, informações precisas e completas sobre a sua saúde. Isso inclui explicações compreensíveis sobre seus cuidados médicos condição, plano de manejo, medicamentos prescritos ou produtos médicos.

Direito a uma comunicação eficaz que seja culturalmente apropriada e adaptada à sua idade, alfabetização e necessidades individuais.

Direito de participar ativamente nas discussões sobre seus cuidados e da tomada de decisões e, quando necessário, direito ao apoio para a tomada de decisão, bem como consultas individuais, ajudas decisionais, materiais educativos e vídeos.

Direito de exercer sua capacidade jurídica, envolvendo um representante legal escolhido no processo de tomada de decisão.

Direito de acesso ao prontuário – Os pacientes têm o direito de acessar ou obter uma cópia de seu prontuário, seja físico ou eletrônico, atualizado e com informações corretas.

Direito de ser escutado e à solução justa – Os pacientes têm o direito de compartilhar suas experiências, apresentar queixas e relatar incidentes de segurança ocorridos durante seu cuidado.

Em caso de incidente, os pacientes têm direito a explicações honestas sobre o que aconteceu, suas causas e as ações tomadas para reparação, resolução justa e prevenção de novos incidentes.

Direito ao engajamento do paciente e familiar – Os pacientes têm o direito de serem parceiros ativos nos seus cuidados, com foco particular em garantir sua segurança em todas as etapas da prestação de cuidados.

Subsequentemente, serão delineadas algumas estratégias de implementação da Carta:

Quadro legislativo, políticas públicas e mecanismos regulatórios

Destinários: Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde, ANVISA e Vigilância Sanitária nos Estados e Municípios.

Ação: Realizar uma análise abrangente das normas, programas, políticas, protocolos e mecanismos regulatórios em relação à segurança do paciente, qualidade do cuidado e temas afetos à luz da Carta.

Objetivo: Adaptar seu quadro legislativo, políticas e mecanismos regulatórios à Carta, tanto aos seus conceitos essenciais quanto aos seus direitos.

Destinário: Congresso Nacional.

Ação: Aprovar um a legislação nacional de direitos do paciente fundamentada nos direitos humanos.

Objetivo: Assegurar que o país tenha uma lei que se aplique a todos os pacientes, garantido seus direitos.

Incorporação da Carta em diretrizes profissionais

Destinários: Conselhos Profissionais.

Ação: Adotar resoluções que estabeleçam deveres deontológicos dos profissionais de saúde atinentes aos direitos previstos na Carta.

Objetivo: Balizar a ética profissional a partir dos direitos dos pacientes, conformando uma nova cultura nos cuidados em saúde.

Mecanismos de responsabilização, reparação e incentivo.

Destinários: Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde e organizações de saúde.

Ação: Criar ou usar mecanismos existentes para que as organizações de saúde informem pacientes e familiares sobre os direitos previstos na Carta.

Designar canais acessíveis para os pacientes e familiares apresentarem queixas sobre violações de direitos e estabelecer ações corretivas para a sua resolução.

Construir incentivos para a adesão à Carta, como a designação de “Charter champions” em unidades de saúde.

Objetivo: Disseminar o conteúdo da Carta e assegurar que os seus direitos sejam efetivados.

Capacitação de profissionais de saúde baseada na Carta

Destinários: Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde, Ministério da Educação e organizações de saúde.

Ação: Incorporar a segurança do paciente e os direitos previstos na Carta na formação dos profissionais de saúde e na sua educação continuada.

Objetivo: Capacitar os profissionais de saúde com as competências necessárias para defender e implementar os direitos previstos na Carta.

Monitoramento, avaliação e melhoria

Destinários: Ministério da Saúde, Secretarias de Saúde e organizações de saúde

Ação: Estabelecer mecanismos para monitoramento, avaliação e melhoria da Carta e das suas estratégias de implementação, avaliando regularmente a eficácia das várias abordagens e fazendo ajustes conforme necessário.

Estabelecer mecanismos independentes ou utilizar mecanismos existentes mecanismos para avaliar o cumprimento dos direitos de segurança do paciente, analisar as queixas dos pacientes e familiares, de forma transparente.

Objetivo: Acompanhar a implementação da Carta, efetivar o cumprimento dos seus direitos e propor melhorias.

Por fim, seguindo as palavras da OMS, espera-se que a Carta seja um farol de esperança e de compromisso, garantindo que o direito de cada paciente a cuidados seguros seja protegido e que a sua voz seja escutada e valorizada.

1 WORLD HEALH ORGANIZATION. Patient Safety Rights Charter. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/376539/9789240093249-eng.pdf?sequence=1

Acesso em: 15 jul. 2024.

2 ANVISA. Plano de Ação Global para a Segurança do Paciente 2021-2030 (traduzido para português). Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/plano-de-acao-global-para-a-seguranca-do-paciente-2021-2030-traduzido-para-portugues/view. Acesso em: 15 jul. 2024.

3 ALBUQUERQUE, Aline. A segurança do paciente à luz do referencial dos direitos humanos. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rdisan/article/view/122309. Acesso em: 15 jul. 2024.

4 Observa-se que inexiste direito à dignidade, a dignidade é um valor intrínseco dos seres humanos, bem como não há direito ao respeito. O direito à confidencialidade é derivado do direito à privacidade.

Conheça a Carta de Direitos de Segurança do Paciente

Aline Albuquerque, aqui no Blog.
Professora do Programa de Pós-Graduação em Bioética da Universidade de Brasília. Coordenadora do Observatório Direitos do Paciente da Universidade de Brasília. Pesquisadora Visitante na Universidade de Oxford. Pós-doutorado pela Universidade de Essex. Doutorado em Ciências da Saúde. Autora dos livros Bioética e Direitos Humanos, Direitos Humanos dos Pacientes e Capacidade Jurídica e Direitos Humanos. Membro da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente. Membro do Comitê Hospitalar de Bioética do Grupo Hospitalar Conceição e do Comitê Hospitalar de Bioética do Hospital de Apoio de Brasília. Membro do Redbioética da UNESCO.

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