Aline Albuquerque Norbert Elias ao tratar do tema do envelhecer e do morrer, aponta para o afastamento dos jovens em relação às pessoas idosas, enquanto um ato de resistência à ideia do seu próprio envelhecimento e mortalidade[1]. Na mesma direção, Byung-Chul Han formula o conceito de “sociedade da positividade”, e que nessa, a “dor é vista como um sinal de fraqueza” e se busca o prolongamento da vida a qualquer custo, como resultante de uma visão “positiva”.[2]
O paciente é aquele que vivência a fragilidade humana em sua expressão mais significativa, pois a doença impacta todos os âmbitos da sua vida, provocando mudanças inesperadas e profundas. Assim, o termo “paciente”, que decorre do verbo latino “patior” e significa sofrer ou aguentar, expressa as condições concretas em que um paciente se encontra, como a de vulnerabilidade acrescida[3], e os sentimentos que o invade, como os de insegurança, de incerteza e de medo.
O termo “paciente” evidencia a situação real pelo qual uma pessoa enferma passa, ressaltando a sua dor e, eventualmente, a finitude da sua vida. A escolha por outros termos como “cliente”, “usuário” ou “consumidor” para expressar uma condição humana tão profunda e existencial se mostra, como aponta Byung-Chul Han, uma tentativa de endossar a “sociedade da positividade”, na qual “a passividade do sofrer não tem lugar na sociedade ativa dominada pelo poder”[4].
Particularmente, em relação ao termo “cliente”, embora, no passado, possa-se ter sido usado para se afastar a conotação de passividade que estaria presente na palavra “paciente”, atualmente, verifica-se que “cliente” é amplamente empregado na relação entre o consumidor e uma empresa. Dessa forma, tratar o paciente como “cliente” é impregnar de sentido consumerista e econômico uma relação essencialmente humana, mitigando o sofrimento atrelado à enfermidade e conferindo-lhe uma positividade, desprovida de conexão com a verdade.
A participação e o engajamento do paciente em seu cuidado são desejados e devem ser promovidos por profissionais e sistemas de saúde. Mas, o fato de se entender que o paciente é um sujeito ativo do seu próprio cuidado, não afasta o reconhecimento da sua vulnerabilidade acrescida e da dor, física ou psíquica, que se encontra presente naquele que busca um profissional de saúde. Essa dor decorre da sua enfermidade ou do sofrimento psíquico gerado pela fragilidade ocasionada pela sua condição.
Conclui-se que o termo “paciente” evidencia a condição verdadeira da pessoa enferma, cujo cuidado em saúde consiste em técnica, mas também em um dispositivo apto a construir uma narrativa para a sua dor. Por fim, uma reflexão com base nas palavras de Theodor W. Adorno: “a necessidade de deixar o sofrimento se tornar eloquente é condição de toda verdade.”[5]
[1] ELIAS, Norbert. A solidão dos moribundos. São Paulo: Zahar, 2001.
[2] HAN, Byung-Chul. Sociedade paliativa: a dor hoje. São Paulo: Vozes, 2020.
[3] ANDORNO, Roberto. Dignity in Psychotherapy. In: The Oxford Handbook of Psychotherapy Ethics (Oxford University Press). Edited by Manuel Trachsel, Jens Gaab, Nikola Biller-Andorno, Şerife Tekin, and John Z. Sadler.
[4]HAN, Byung-Chul. Sociedade paliativa: a dor hoje. São Paulo: Vozes, 2020.
[5] Apud HAN, Byung-Chul. Sociedade paliativa: a dor hoje. São Paulo: Vozes, 2020.