Kalline Eler
O critério dos melhores interesses da criança está previsto no art. 3, parágrafo 1, da Convenção Sobre os Direitos da Criança –CDC, devendo ser empregado em todas as decisões sobre a criança para assegurar a fruição plena e efetiva dos direitos reconhecidos na CDC, bem como seu pleno desenvolvimento que abrange os aspectos físico, mental, espiritual, moral, psicológico e social.
De acordo com esse critério, os interesses da criança deverão ser considerados primordiais para a tomada de decisão quando diferentes interesses estiverem conflitando. Ainda, consoante o Comitê sobre os Direitos da Criança, no momento de avaliar e determinar o melhor interesse da criança, os seguintes elementos deverão ser ponderados: a opinião da criança; a identidade da criança; a preservação do ambiente familiar e a manutenção de relações; cuidados, a proteção e segurança da criança; sua situação de vulnerabilidade; o direito da criança à saúde; e o direito da criança à educação (ELER, 2020).
Diante disso, o dever de agir de acordo com os melhores interesses da criança fornece a base ético-jurídica para o exercício da autoridade parental, estabelecendo, assim, os seus limites. Com efeito, os pais que tomam decisões sobre a saúde da criança de forma não consentânea com seus melhores interesses atuam além dos limites da sua autoridade parental e, por isso, estão sujeitos à intervenção judicial para restringir esse excesso.
Nesse sentido, cita-se por exemplo, o caso Vavřička and Outros v. República Tcheca (aplicação No. 47621/13 e cinco outras aplicações) no qual a Grande Câmara de 17 juízes da Corte Europeia de Direitos Humanos endossou a proporcionalidade das medidas que tornam obrigatórias as vacinas infantis, por serem “medidas necessárias em uma sociedade democrática” para proteger a saúde da criança e a saúde da população.
Assim, o critério dos melhores interesses da criança deve permear o exercício da autoridade parental nas tomadas de decisão no curso do cuidado em saúde, sendo esse critério vital para estabelecer a condição da criança como uma pessoa detentora de direitos e interesses próprios reconhecidos e protegidos em lei e em normas do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Além disso, no contexto dos cuidados em saúde, o critério dos melhores interesses da criança é aplicado através do Cuidado Centrado na Criança (CCC) que consubstancia uma nova forma de prover cuidados em saúde que respeita às necessidades, vontade e preferências da criança, bem como seus melhores interesses.
Portanto, na hipótese de conflito entre os interesses da criança e os interesses da família, o profissional de saúde deverá conduzir sua prática a partir daquilo que melhor servir à criança, ou seja, deverá privilegiar a ótica da qualidade de vida da criança, considerando sua condição de saúde e optando por aquilo que lhe trouxer maior benefício, uma vez sopesados prós e contras.
ReferênciasELER, Kalline. Capacidade Jurídica da Criança e do Adolescente na Saúde. Rio de Janeiro: Lúmen Iuris, 2020.