Você Conhece a Nova Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul?

Atualizado em 23/12/2024
Por Aline Albuquerque

Você Conhece a Nova Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul?

Atualizado em 23/12/2024
Por Aline Albuquerque

Você Conhece a Nova Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul?

No último dia 16 de dezembro, o Estado do Rio Grande do Sul aprovou a Lei dos Direitos do Paciente – Lei nº 16.204, de 16 de dezembro de 20241. A Lei estabelece os direitos dos pacientes quando envolvidos em cuidados prestados por serviços de saúde de qualquer natureza ou por profissionais de saúde. A Lei inaugura o reconhecimento legislativo do Direito do Paciente, Novo ramo jurídico, autônomo e detentor de princípios, direitos e mecanismos de implementação próprios. A Lei nº 16.204, de 2024, é uma medida louvável de um ente da federação, que materializa no âmbito estadual, a Carta dos Direitos de Segurança do Paciente, adotada pela Organização Mundial da Saúde2, neste ano.

A Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul é a primeira lei estadual que dispõe especificamente sobre tais direitos, conformando uma genuína carta de direitos do paciente, a despeito de outros entes da federação contarem com leis estaduais que também preveem alguns direitos do paciente3. Esse avanço legislativo deve-se a um movimento proveniente do referido Estado em torno da luta pelos direitos do paciente, o qual contou com a atuação do Deputado Estadual Pepe Vargas, autor da Lei mencionada, e do Comitê de Bioética do Grupo Hospitalar Conceição. Previamente à apresentação do Projeto de Lei que deu ensejo à Lei nº 16.204, de 16 de dezembro de 20244, o então Deputado Federal Pepe Vargas apresentou o Projeto de Lei n° 2242, de 2022 – Estatuto dos Direitos do Paciente5, aprovado na Câmara dos Deputados e, atualmente, no Senado Federal. Espera-se que a aprovação da Lei do Rio Grande do Sul seja um fato impulsionador da aprovação do Projeto de Lei n° 2242, de 2022 – Estatuto dos Direitos do Paciente.

Retomando a Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul, destaca-se a sua importância ímpar ao incorporar a um texto legal conceitos e direitos até então inexistentes no ordenamento jurídico brasileiro. Quanto aos conceitos, cabe ressaltar o conceito de autodeterminação, o de diretivas antecipadas, o de representante do paciente, e o de consentimento informado6. Como se nota, todos os serviços de saúde do Estado devem assegurar o respeito à autodeterminação do paciente, ao seu consentimento informado e às suas diretivas antecipadas. Ademais, segundo a nova Lei, os pacientes têm o direito de contar com um representante, caso não tenham capacidade decisional para consentir, de modo que a sua vontade e preferências sejam respeitadas no contexto do cuidado em saúde, o que é consentâneo com o Cuidado Centrado no Paciente.

No que tange aos direitos previstos na nova Lei, são apresentados no seguinte quadro:

Direito do PacientePrevisão Legal
Direito ao Representante do PacienteO paciente tem o direito de indicar livremente um representante em qualquer momento de seus cuidados em saúde, por meio de registro em seu prontuário.
Direito ao Acompanhantedireito de contar com um acompanhante em consultas e internações, salvo quando o médico ou profissional responsável pelos seus cuidados entender que a presença do acompanhante possa acarretar prejuízo à saúde ou à segurança do paciente ou de outrem.
Direito ao Cuidado em Saúde de Qualidadedireito de ter acesso a cuidados em saúde de qualidade, no tempo oportuno, e de ser atendido em instalações físicas limpas e adequadas, bem como por profissionais de saúde adequadamente formados e capacitados.
Direito ao Cuidado em Saúde Segurodireito de realizar perguntas aos profissionais de saúde, tais como sobre a higienização das mãos e instrumentos, o local correto de seu corpo que será submetido a procedimento cirúrgico ou invasivo, e o nome e como pode contatar o médico que está encarregado de seus cuidados.
direito de ser informado sobre a procedência dos insumos de saúde e medicamentos que lhes são destinados e de verificar, antes de recebê-los, inclusive informação sobre a dosagem prescrita, eventuais efeitos adversos e outras que visem a assegurar-lhe sua segurança.
Direito de não ser discriminadodireito de não ser tratado com distinção, exclusão, restrição ou preferência baseadas em raça, cor, religião, enfermidade, deficiência, orientação sexual ou identidade de gênero, origem nacional ou étnica, renda, de modo que provoque restrições em seus direitos.
Direito de participar das decisões sobre seu cuidado em saúdedireito de envolver-se ativamente em seus cuidados em saúde, participando da decisão sobre seus cuidados em saúde e do plano terapêutico.
Direito à informaçãodireito à informação sobre sua condição de saúde, o tratamento e eventuais alternativas, os riscos e benefícios dos procedimentos, e os efeitos adversos dos medicamentos.
direito de ser informado se o tratamento, o medicamento e o método diagnóstico são experimentais, bem como de consentir ou de se recusar a participar de pesquisa em saúde, em conformidade com as normativas específicas sobre ética em pesquisa.
Direito ao Consentimento Informadodireito ao consentimento informado sem coerção ou influência indevida, salvo em situações de risco de morte em que esteja inconsciente.
Direito à Confidencialidade das Informações Pessoaisdireito à confidencialidade das informações sobre seu estado de saúde, tratamento e outras de cunho pessoal, mesmo após sua morte, salvo as exceções previstas em lei.
direito de consentir ou não com a revelação de informações pessoais para terceiros não previamente autorizados, incluindo familiares, exceto quando houver determinação legal
Direito à privacidade física e associativadireito de ser examinado em lugar privado, salvo em situações de emergência ou de cuidados intensivos;
o direito de recusar qualquer visita;
o direito de consentir ou não a presença de estudantes e profissional de saúde estranho aos seus cuidados em saúde.
Direito à Segunda Opiniãodireito de buscar segunda opinião ou parecer de outro profissional ou serviço sobre seu estado de saúde ou procedimentos recomendados, em qualquer fase do tratamento, bem como de ter tempo suficiente para tomar decisões, salvo em situações de emergência.
Direito de Acesso ao Prontuáriodireito de ter acesso ao seu prontuário médico, sem necessitar apresentar justificativa, inclusive de obter cópia sem ônus, de solicitar retificação e de exigir que seja mantido em segurança.
Direito ao Respeito das Diretivas Antecipadasdireito de ter suas diretivas antecipadas de vontade respeitadas pela família e pelos profissionais de saúde.
Direito a Morrer com Dignidadedireito de morrer com dignidade, livre de dor e de escolher o local de sua morte.

Ainda, a Lei dispõe sobre as condutas a serem adotadas pelos pacientes que correspondem às suas responsabilidades no processo terapêutico. Essas responsabilidades envolvem o compartilhamento de informações sobre doenças passadas, internações, medicamento do qual fazem uso e outras pertinentes com os profissionais de saúde, visando a auxiliá-los na condução de seus cuidados7, além de outras previstas pela Lei.

Quanto à implementação da Lei, poderá o Poder Executivo, divulgar ampla e periodicamente o seu conteúdo, realizar pesquisas periódicas sobre a qualidade dos serviços de saúde e a observância dos direitos dos pacientes, estimular estudos e pesquisas acadêmicas, produzir relatório periódico sobre a sua implementação, viabilizar o acolhimento de reclamação de paciente, familiar e outros interessados sobre o descumprimento dos direitos dos pacientes e viabilizar o acompanhamento do processamento pelo órgão ou entidade competente da reclamação do paciente, familiar e outros interessados, encaminhando relatório.

Sublinha-se que a Lei reconhece o direito dos pacientes e familiares de apresentarem reclamação e o direito ao seu processamento adequado pelos órgãos e entidades do Sistema de Saúde. Esses direitos se amoldam aos termos da Carta dos Direitos de Segurança do Paciente da OMS, que estabelece o direito do paciente de ser escutado e de obter resolução justa, bem como o “direito de compartilhar suas experiências, registrar reclamações e notificar incidentes de segurança que ocorram durante seus cuidados.”8

A Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul é uma medida legal extraordinária, pois é a primeira normativa do Brasil a consolidar o elenco dos direitos do paciente, fundamentados no referencial dos direitos humanos. Esperamos que a aprovação da Lei do Rio Grande do Sul seja um primeiro passo no caminho da construção de uma nova cultura nos cuidados em saúde, fundamentada no respeito dos direitos dos pacientes. Ainda, ressalta-se que a Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul tem um papel não apenas jurídico e político, mas também simbólico, de apontar para a sociedade brasileira a imperiosidade de prover cuidado em saúde de qualidade, o que implica a garantia dos direitos do paciente em todo o território nacional, o que será alcançado por meio da aprovação no Congresso Nacional do Projeto de Lei n° 2242, de 2022 – Estatuto dos Direitos do Paciente.

1 RIO GRANDE DO SUL. LEI Nº 16.204, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2024. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/rs/lei-ordinaria-n-16204-2024-rio-grande-do-sul-dispoe-sobre-os-direitos-dos-pacientes-e-da-outras-providencias. Acesso em: 20 dez. 2024.

2 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Carta dos Direitos de Segurança do Paciente. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/60627/9789275728710_por.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 20 dez. 2024.

3 Para verificar as demais leis estaduais, recomenda-se: ALBUQUERUQUE, Aline. Manual de Direito do Paciente. Belo Horizonte: CEI, 2020.

4 RIO GRANDE DO SUL. LEI Nº 16.204, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2024. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/rs/lei-ordinaria-n-16204-2024-rio-grande-do-sul-dispoe-sobre-os-direitos-dos-pacientes-e-da-outras-providencias. Acesso em: 20 dez. 2024.

5 SENADO FEDERAL. Projeto de Lei n° 2242, de 2022. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/154422. Acesso em: 20 dez. 2024.

6 RIO GRANDE DO SUL. LEI Nº 16.204, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2024. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/rs/lei-ordinaria-n-16204-2024-rio-grande-do-sul-dispoe-sobre-os-direitos-dos-pacientes-e-da-outras-providencias. Acesso em: 20 dez. 2024.

7 RIO GRANDE DO SUL. LEI Nº 16.204, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2024. Disponível em: https://leisestaduais.com.br/rs/lei-ordinaria-n-16204-2024-rio-grande-do-sul-dispoe-sobre-os-direitos-dos-pacientes-e-da-outras-providencias. Acesso em: 20 dez. 2024.

8 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Carta dos Direitos de Segurança do Paciente. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/60627/9789275728710_por.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 20 dez. 2024.

Você Conhece a Nova Lei dos Direitos do Paciente do Rio Grande do Sul?

Aline Albuquerque, aqui no Blog.
Professora do Programa de Pós-Graduação em Bioética da Universidade de Brasília. Coordenadora do Observatório Direitos do Paciente da Universidade de Brasília. Pesquisadora Visitante na Universidade de Oxford. Pós-doutorado pela Universidade de Essex. Doutorado em Ciências da Saúde. Autora dos livros Bioética e Direitos Humanos, Direitos Humanos dos Pacientes e Capacidade Jurídica e Direitos Humanos. Membro da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente. Membro do Comitê Hospitalar de Bioética do Grupo Hospitalar Conceição e do Comitê Hospitalar de Bioética do Hospital de Apoio de Brasília. Membro do Redbioética da UNESCO.

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