Aline Albuquerque
Muitas pessoas, inclusive profissionais de saúde, têm medo da palavra “paciente”. Querem substituí-la por “pessoa que vive com a condição X”, “usuário”, “cliente” e outras tantas que a imaginação permitir.
Paciente, em sua etimologia, vem do latim “pati” e do grego “pathé”, ou seja, de sofrimento ou padecimento.[1] Como se pode notar, o termo “paciente” indica uma condição humana de fragilidade inerente. Todos nós somos frágeis e sofremos ao longo das nossas vidas, a condição de paciente apenas expõe de uma forma contundente os limites do corpo humano e a finitude da vida. Ser paciente é uma condição singular, pois altera sua relação consigo e com o mundo, interfere na sua rotina e muda seus planos de vida. Pode-se dizer que é uma condição radical, principalmente se envolver uma doença ameaçadora da vida.
Não usar o termo “paciente” é negar a fragilidade humana e a experiência única de viver com uma determinada enfermidade. Desejar igualar o paciente a uma pessoa que não experiencia a doença em seu próprio corpo e não foi abalada emocionalmente, como um usuário do serviço de telefonia ou o cliente de uma loja de departamentos, é empobrecer a experiência humana, inexoravelmente imbricada com a dor, o sofrimento e a dependência do outro.
É lamentável que se dissemine a ideia de que o empoderamento, a ativação, o engajamento e a participação do paciente tenham relação com a negação da sua condição única de experienciar viver com uma enfermidade. Ao revés, o que dá força ao paciente para participar ou se engajar em seu cuidado é o reconhecimento da sua fragilidade e da necessidade de apoio, o que na nossa sociedade costuma ser visto como “fraqueza e passividade”. Negligenciar a condição particular do paciente implica não o apoiar e deixar de promover a sua autodeterminação.
Diferentemente do que se divulga, o termo “paciente” não guarda relação com ser submisso, mas sim com o padecimento humano implicado na condição de estar enfermo e vulnerável. E reconhecer essa condição é o primeiro passo do caminho do engajamento e do empoderamento do paciente. Usar termos como “usuário” ou “pessoa que vive com a condição X” é um recurso eufemístico que retira a força do modo de se nomear alguém como paciente, condição com uma singularidade inigualável, mormente quando implica uma doença grave e incurável.
Triste ver que vivemos, como define o filósofo atual Byung-Chul Han, na “sociedade da positividade”, que busca se desonerar de toda forma de sofrimento. “A passividade do sofrer não tem lugar na sociedade ativa dominada pelo poder”.[2]
[1] NEUBERGER, Julia. Do we need a new word for patients? BMJ. 1999 Jun 26; 318(7200): 1756–1758.
[2] HAN, Byung-Chul. Sociedade paliativa. São Paulo: Vozes, 2020.
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