Três estudos recentes sobre empatia clínica

Atualizado em 09/10/2023
Por Aline Albuquerque

Três estudos recentes sobre empatia clínica

Atualizado em 09/10/2023
Por Aline Albuquerque

Três estudos recentes sobre empatia clínica

Aline Albuquerque

Artigo publicado, em setembro de 2023, trata de um estudo transversal de âmbito nacional, realizado no Japão, acerca das diferenças nos níveis de empatia entre médicos com base na sua especialidade.

O estudo parte da assunção de que a capacidade de empatia do médico é crucial para os resultados de saúde do paciente, e isso difere de acordo com a especialidade, características pessoais e fatores ambientais.

Assim, a pesquisa objetivou examinar os níveis de empatia entre médicos com base em suas especialidades e identificar os fatores que a influenciam.

A pesquisa nacional contou com 5.441 médicos no Japão registrados como membros do Nikkei Medical Online em 20 especialidades. Os pesquisadores utilizaram a  Escala de Empatia de Jefferson (JSE) para medir os níveis de empatia dos médicos.

O estudo constatou que houve uma diminuição significativa nos níveis de empatia quando o pai do participante também era médico e que ser médica de clínica geral ou médica em posição elevada e com filhos foi positiva e significativamente correlacionada com altos níveis de empatia.

Outro estudo, publicado em maio de 2023, sobre os efeitos da comunicação empática sobre pacientes que iriam se submeter a uma biopsia mamária, verificou que distribuir um folheto e apoiar a paciente durante o procedimento diagnóstico por um médico treinado em comunicação empática podem estar associados à menor percepção de dor durante a biópsia e à redução da ansiedade pós-procedimento.

Além disso, a intervenção poderia afetar positivamente a sensação da paciente de estar bem-informada sobre o procedimento. Além disso, a capacitação em comunicação parece aumentar as habilidades de comunicação empática dos médicos.

Portanto, concluiu-se que um folheto com informações padronizadas sobre o procedimento de biópsia mamária é útil e, após o estudo, passou a ser  distribuído para todas as pacientes que necessitam de biópsia mamária.

O último artigo diz respeito à JSE, que se insere no The Jeferson Empathy Project, e foi escrito pelo seu criador em conjunto com colaboradores. A  JSE considera que a empatia é um atributo cognitivo que envolve a capacidade de compreender a dor, o sofrimento e a perspectiva do paciente, combinada com a capacidade de comunicar essa compreensão e uma intenção de ajudar.

Como se nota, para a JSE a empatia não abarca aspectos emocionais, como o contágio emocional e a ressonância emocional, componentes da empatia, quando se considerada sob a ótica de sua dimensão emocional.

No que tange ao artigo, o Projeto partiu da preocupação crescente com a dependência excessiva dos profissionais médicos de tecnologias baseadas no uso de computadores e com o fato de que a tecnologia diagnóstica e terapêutica poderia limitar a visão dos estudantes e dos profissionais sobre a importância do ser humano na interação constitutiva do cuidado em saúde.

Ademais, outro fator, destacado pelo Projeto, diz respeito ao aumento dos custos dos cuidados em saúde e a tendência para cuidados orientados para o mercado, o que concorreu para a erosão da imagem pública dos médicos, levando à negligência da importância do fator humano na saúde.

Com efeito, essa cadeia de eventos levou a uma tendência que provocou uma mudança de paradigma na educação e na prática médica.

Isto é, passou-se a enfatizar habilidades comunicacionais e sociais, traduzindo-se, por exemplo, no treinamento de médicos em empatia, de modo que pudessem recuperar sua imagem altruísta, atrelada aos  médicos atenciosos dos bons e velhos tempos, e recuperar a reputação da medicina como uma profissão de cuidado. 

Voltando ao tema da relação entre empatia clínica e especialidades, os pesquisadores, neste artigo, esperavam que os pontuadores mais altos no JSE estivessem mais inclinados a escolher especialidades que exigem encontros contínuos e prolongados com os pacientes.

Estas especialidades são descritas como “orientadas para as pessoas”, tais como as especialidades de cuidados primários (medicina interna geral, família medicina e pediatria) e psiquiatria.

Por outro lado, esperavam que os alunos com pontuações baixas no JSE estivessem mais interessados em especialidades que exigem menor interação com os pacientes e muitas vezes envolvem a realização de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos.

Essas especialidades são descritas como “orientadas para tecnologia/procedimento”, como especialidades hospitalares (patologia, radiologia e anestesiologia), urologia, cirurgia e subespecialidades cirúrgicas. Essas expectativas foram confirmadas em vários estudos.

Por exemplo, os médicos nas especialidades “orientadas para as pessoas” obtiveram pontuações mais altas no JSE em comparação com outros nas especialidades “orientadas para a tecnologia/procedimentos”, consistente com descobertas relatadas por outros pesquisadores nos Estados Unidos e no exterior.

Em outros estudos com alunos do primeiro ano de medicina, aplicou-se o JSE no início da faculdade de medicina antes que os alunos fossem expostos à educação médica formal.

Os resultados mostraram uma significativa associação entre as pontuações no JSE e o interesse daqueles que planejavam seguir uma carreira “orientada para as pessoas”, após a formatura da faculdade de medicina.

Esta descoberta sugere que a maioria dos matriculados em escolas de medicina que estão interessados em buscar especialidades “orientadas para as pessoas”, depois de concluírem a faculdade de medicina, têm maior probabilidade de seguirem essas especialidades, quando comparados com outros que expressaram interesse em buscar especialidades “orientadas para tecnologia/procedimento”.

Isso porque os primeiros já possuem um atributo básico de personalidade (refletido em suas pontuações mais altas no JSE),  que os leva a escolher especialidades “voltadas para as pessoas” antes de serem expostos para a educação médica formal.

Curiosamente, o padrão de reclamações por negligência médica em relação a médicos que atuam em diferentes especialidades é consistente com os resultados de pesquisa sobre as pontuações JSE, de modo que aqueles que praticam em especialidades “orientadas para as pessoas” eram menos propensos a serem acionados em litígios por negligência médica do que aqueles nas especialidades “orientadas para procedimentos/tecnologia”.

1- WATARI, Takashi et al. Differences in empathy levels among physicians based on specialty: a nationwide cross-sectional study. Disponível em: https://academic.oup.com/pmj/advance-article-abstract/doi/10.1093/postmj/qgad084/7281517?redirectedFrom=fulltext&login=false. Acesso em: 3 out. 2023.

2- MACHACEK, Martina et al. Impact of a brochure and empathetic physician communication on patients’ perception of breast biopsies. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10520099/. Acesso em: 3 out. 2023.

3-  HOJAT, Mohammadreza et al. Clinical empathy: definition, measurement, correlates, group differences, erosion, enhancement, and healthcare outcomes. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s44250-023-00020-2. Acesso em: 3 out. 2023.

4-  THOMAS JEFFERSON UNIVERSITY. Jefferson Scale of Empathy©. Disponível em: https://www.jefferson.edu/academics/colleges-schools-institutes/skmc/research/research-medical-education/jefferson-scale-of-empathy.html. Acesso em: 3 out. 2023.

Três estudos recentes sobre empatia clínica

Aline Albuquerque, aqui no Blog.
Professora do Programa de Pós-Graduação em Bioética da Universidade de Brasília. Coordenadora do Observatório Direitos do Paciente da Universidade de Brasília. Pesquisadora Visitante na Universidade de Oxford. Pós-doutorado pela Universidade de Essex. Doutorado em Ciências da Saúde. Autora dos livros Bioética e Direitos Humanos, Direitos Humanos dos Pacientes e Capacidade Jurídica e Direitos Humanos. Membro da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente. Membro do Comitê Hospitalar de Bioética do Grupo Hospitalar Conceição e do Comitê Hospitalar de Bioética do Hospital de Apoio de Brasília. Membro do Redbioética da UNESCO.

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