A capacidade mental ou seja a capacidade para tomar decisões é crucial para que o paciente consiga, efetivamente, exercer sua autonomia sobre sua própria saúde, elegendo aos tratamentos e procedimentos conforme suas necessidades, vontade e preferências
A avaliação da capacidade decisional é um direito do paciente e, para definir se o paciente tem capacidade mental, existem vários instrumentos avaliativos construídos por neurocientistas, médicos, psicólogos e juristas.
Nos países que fazem a avaliação da capacidade decisional do paciente, comumente, aplica-se o Instrumento de Avaliação de Competências MacArthur – MacCAT por ter maior fundamentação empírica e nível de aplicação reiterada confiável.
Segundo esse teste, quatro habilidades afiguram-se imprescindíveis para atestar a capacidade decisional de alguém, quais sejam: a) entendimento; b) apreciação; c) raciocínio; d) comunicação da decisão.
A despeito da importância desse teste de avaliação da capacidade decisional, observa-se que são desconsiderados uma série de mecanismos não-cognitivos que desempenham um papel importante na tomada de decisão de pacientes que têm, por exemplo, demência.
Assim, os parâmetros do MacCAT e de outros testes têm sido criticados por serem hipercognitivistas, por não apontarem com exatidão como as decisões são feitas na vida real. Importante ressaltar que a maioria das pessoas age irrefletidamente e as decisões são em boa parte fruto do ambiente no qual a pessoa está inserida, e não apenas do processo de raciocínio do cérebro.
Dessa forma, pessoas que não tem sinais aparentes de alguma deficiência mental ou algum transtorno não são submetidas a testes de avaliação e continuam livremente tomando decisões com base nas suas emoções, medos, e desejos excêntricos. Ao passo que pacientes com deficiência cognitiva, por exemplo pacientes com demência, precisam satisfazer os padrões colocados por testes que privilegiam a avaliação dos aspectos cognitivos nas tomadas de decisão.
Por isso, uma nova geração de instrumentos de avaliação da capacidade para tomar decisões em saúde tem surgido. Um bom exemplo é o U-Doc desenvolvido por uma equipe multidisciplinar de pesquisadores na Suíça e que enfatiza o processo de julgamento ao invés de limitar-se à mensuração das habilidades cognitivas e decisionais. Assim, esse instrumento permite ter uma visão mais holística do processo de tomada de decisão e da capacidade de refletir sobre os próprios valores. Inclusive, esse instrumento permite que o avaliador perceba o quanto da sua perspectiva e das suas intuições influenciam na avaliação da capacidade
Neste instrumento, avalia-se, por exemplo, se os critérios tradicionais objetivos (entendimento; apreciação; formação do raciocínio; e comunicação da decisão) são relevantes para a decisão específica que se pretende tomar; se os déficits nas habilidades mentais são significantes e se esses déficits, por outro lado, são compensados por outras habilidades.
Em síntese, o instrumento que ainda carece de maior validação empírica apoia-se em uma perspectiva holística do paciente e traz para o debate da avaliação da capacidade mental do paciente a importância dos profissionais de saúde refletirem sobre preconceitos pessoais e colocarem maior ênfase no processo de tomada de decisão como um todo, o que poderá contribuir para um cuidado mais centrado no paciente.
Referências:
Hermann H, Feuz M, Trachsel M, Biller-Andorno N. Decision-making capacity: from testing to evaluation. Med Health Care Philos. 2020 Jun;23(2):253-259